Abstract

A obra de Descartes tem sido estudada de forma por vezes des-contextualizada. O autor aparece-nos então como um frio racionalista despido de emoções e responsável por tudo o que de pior a modernidade nos legou. Todavia, o estudo das emotivas relações de Descartes com os seus mestres Jesuítas, feita sobretudo com base na correspondência que com eles manteve, revela-nos um carácter emocional, um homem atormentado pelo desejo da verdade, de uma verdade solidamente fundamentada, numa época em que o edifício do saber tradicional parecia abrir fendas um pouco por todo o lado. A frieza racionalista de Descartes aparece-nos assim como a parte visível do "iceberg cartesiano", cuja parte menos visível era de natureza profundamente emocional Por outro lado, tendo em conta as semelhanças entre o contexto cultural em que viveu, num virar de século, e o actual contexto de final do século XX, a personalidade angustiada e inquieta de Descartes não pode deixar de nos aparecer com uma notável actualidade. /// Descartes' philosophy has often be analised out of context. He then appears like a cold-blooded rationalist, completely void of emotions and responsible for the worst of our modern heritage. However, the study of the emotional relationship between Descartes and his teachers, the Jesuits, based mainly on their correspondance, reveals his emotional character, a man tortured by the desire of truth, of a solidly grounded truth, in a time when cracks in the building of traditional knowledge cracks seemed to appear everywhere. Thus, the rational coolness of Descartes appears as the visible part of the "cartesian iceberg", whose less visible part was of a deeply emotional nature. On the other hand, taking into account the similarities between the cultural context in which he lived, in a turn of his century, and the present day context of the end of the XXth century, the anxious and troubled personality of Descartes appears as having a particular relevance.